Análise do Discurso: conceito, origem, teóricos e usos

Diferentemente da análise gramatical que foca na estrutura das sentenças, a análise do discurso é centrada na linguagem. Em outras palavras, ela analisa textos, falas públicas, obras de arte, narrativas de filmes e outras formas de expressão, inclusive não verbais

O campo, que se popularizou após os anos 60, examina as produções em busca dos elementos que as definem. Para isso, são analisados ideologia e contexto social e cultural do sujeito, isto é, autor do discurso, buscando, assim, o sentido do texto.

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Análise do discurso: conceito, escolas, teóricos, usos e origem

O que é análise do discurso? 

A Análise do discurso (AD) é uma ciência da linguagem associada às disciplinas de filosofia, história e teoria social. Ela estuda a produção de sentidos na relação entre língua, sujeito e história.

Assim, o seu principal objetivo é entender as concepções presentes nos mais diversos discursos, como: 

  • textos escritos;
  • narrativas;
  • diálogos;
  • falas públicas;
  • obras de artes;
  • linguagens não verbais;
  • dentre outros.

Trata-se de uma análise relativamente nova. Isso porque, até os anos 60, as análises eram centradas no conteúdo dos textos. Nesse sentido, buscavam compreender apenas o que os escritos queriam dizer, ignorando a identidade e os pensamentos de quem os escreveu. 

Por intermédio da análise do discurso, a organização interna do texto passou a não ser o único foco, uma vez que é necessário entender também o porquê de sua construção. Melhor dizendo, ao que ela está ligada, como, por exemplo:

  • história;
  • contexto;
  • situação;
  • destinatário;
  • ideologia.

Podemos afirmar, portanto, que discurso é aquilo que ocorre entre duas pessoas que se comunicam, já o texto é o que materializa esse discurso. Assim, todo discurso é composto de princípios, valores e significados que nos ajudam a identificar as relações entre o texto e quem o produziu. 

O resultado de uma análise do discurso vai compreender as ligações da linguagem com as convicções da produção em questão. Isso porque, as palavras podem mudar o sentido de um texto, considerando quem as escreveu. O cargo que essa pessoa ocupa, o momento que vive, de onde ela, qual a sua bagagem cognitiva. Tudo isso interfere no sentido de um texto.

Análise do discurso: elementos que estão além do texto.

Origem da análise do discurso 

O termo “Análise do discurso”, representado pela sigla AD, surgiu na França, no final da década de 1960, pelo lexicólogo Jean Dubois (1920-2015) e o filósofo Michel Pêcheux (1938-1983).

Os dois fundadores enxergavam diferenças nos estudos da análise do discurso. Enquanto Dubois acreditava que a AD seria uma continuidade da Linguística, Pêcheux via a disciplina como um novo campo de análise. Para ele, a linguagem era materializada na ideologia e em como esta podia ser manifestada. 

Em outras palavras, ele acreditava que as circunstância em que algo foi dito ou escrito, bem como as condições ideológicas e históricas, podiam mudar o sentido de um discurso. Inclusive a sua compreensão e os seus efeitos. 

No entanto, além de Dubois e Pêcheux, outros nomes estão ligados a análise do discurso, como Louis Althusser (1918-1990), Michel Foucault (1926-1984), Jacques Lacan (1901-1981) e Mikhail Bakhtin (via Jacqueline Authier-Revuz). Cada um deles contribuiu de alguma forma para a junção de língua, sujeito, discurso e história.

No Brasil, a análise do discurso foi desenvolvida na década de 70, por Eni Orlandi. A AD brasileira resulta da associação entre a língua e a ideologia, o homem e a história. É uma construção que liga a vivência e conhecimento de uma pessoa àquilo que ela fala ou escreve. 

Elementos da análise do discurso 

Os elementos da análise do discurso são de ordem ideológica, política e simbólica. Ou seja, há uma idei de que o texto não pode ser separado do seu contexto de produção. Assim, seguindo as ideias de Pêcheux, todo texto é elaborado por meio de uma estrutura que articula esses elementos e os mantêm coerentes e coesos. 

Dessa forma, temos três níveis de análise:

  • fundamental (a qual se observa o sentido do texto);
  • narrativo (o qual narra os valores fundamentais do texto com menção ao sujeito);
  • discursivo (que envolve a análise do discurso, destacando as escolhas de cada pessoa na hora de dar um sentido ao texto e narrá-lo).

Podemos dizer que apenas um discurso pode sustentar diversos textos, escritos de maneiras diferentes e por pessoas diferentes. No entanto, para a compreensão dessas produções, é necessário que o autor e o leitor tenham o mesmo conhecimento. 

Embora não seja necessário ocuparem a mesma posição ou terem as mesmas opiniões, o conhecimento prévio da situação é fundamental para o entendimento da narrativa. 

Qual a importância da análise do discurso? 

A análise do discurso é importante porque tudo envolve linguagem. Seja um texto, uma peça teatral, uma música, um filme, uma obra de arte, a linguagem estará presente, ainda que não seja verbal. 

Dito isso, a importância da análise do discurso se baseia no fato de ela nos tornar capazes de compreender todas as mensagens que nos permeiam. Assim, é possível entender a relação entre a fala e quem a expressa, entre a linguagem e o poder. 

Esse tipo de análise é necessária para o entendimento de falas problemáticas, discursos contraditórios e até mesmo das diversas manifestações artísticas que nos cercam. Um bom exemplo é quando realizamos a leitura de livros mais antigos, como “Dom Casmurro”. 

Os leitores da atualidade, embora gostem dos títulos de Machados de Assis, muitas vezes têm dificuldade em interpretar as suas obras. Isso porque foram escritas em uma época distante, na qual existiam referências que hoje são antigas e até desconhecidas por alguns. 

Além disso, a análise do discurso é importante para a compreensão de outras realidades. Melhor dizendo, no cotidiano, ela permite o conhecimento de outras ideologias e bagagens cognitivas. Ademais, também é uma excelente forma de se expressar de maneiras diferentes e refletir sobre o sentido dessas manifestações.

Principais teóricos da Análise do Discurso 

Existem muitos nomes associados à AD. No entanto, os principais são:

Michel Pêcheux (1938 – 1984)

Filósofo francês, fundador da análise do discurso. Tem fama de rigoroso e é conhecido por questionar métodos. Trabalhou no Departamento de Psicologia do Centre National de la Recherche Scientifique. Deixou um legado de livros e artigos. 

Michel Foucault (1926 – 1984)

Filósofo francês que usou a análise do discurso na medicina clínica e nas ciências humanas. É conhecido pelas suas críticas às instituições sociais, suas percepções sobre a sexualidade e suas teorias na relação entre poder e conhecimento. Lecionou no Collége de France de 1970 até o ano de seu falecimento.

Eni de Lourdes Puccinelli Orlandi

Pesquisadora brasileira, idealizadora da análise do discurso no Brasil. Foi professora na USP e, atualmente, é coordenadora na UNICAMP. Publicou e/ou organizou mais de 35 livros e em 1993 ganhou o prêmio Jabuti em ciências humanas com a obra “As formas do silêncio”.

Dominique Maingueneau 

Linguista e professor na Universidade de Paris IV Paris – Sorbonne, ele enriqueceu a análise do discurso francesa com reflexões pertinentes e conceitos operatórios de aplicação em mídias digitais, televisivas e textos. Publicou diversos livros e ministrou palestras sobre análise do discurso em universidades brasileiras. 

Maria do Rosário Gregolin 

Livre-docente em análise do discurso pela UNESP. É líder do Grupo de Estudos de Análise do Discurso de Araraquara e docente no departamento de linguística nos programas de graduação e pós-graduação. É autora e coautora em livros sobre análise do discurso. 

Jean-Jacques Courtine (1946 – 2023)

Linguista de formação e professor de antropologia histórica. Especializou-se na análise do discurso, porém sua paixão era as histórias associadas ao corpo e as emoções. Faleceu em 2023, deixando um legado de livros como autor e coautor sobre análise do discurso e histórias do corpo.

Principais escolas da Análise de Discurso

Ao longo do tempo, o campo da AD foi se dividindo em diferentes escolas, cada uma se aprofundando em um determinado ponto da teoria. Nesse sentido, abaixo citamos as cinco principais escolas:

  • Escola Francesa: Fundada por Michel Pêcheux, é influenciada pelo pensamento marxista e foca principal na relação entre linguagem, ideologia e poder.
  • Análise Crítica do Discurso (ACD): Fortemente marcada pela teoria social crítica, essa escola lidera pelos pesquisadores Norman Fairclough, Teun van Dijk, e Ruth Wodak foca na maneira como o discurso configura uma forma de prática social que perpetua desigualdades.
  • Análise do Discurso Psicológico: Tendo como principais expoentes os pesquisadores Jonathan Potter e Derek Edwards, essa escola está centrada no estudo da linguagem como instrumento de interação social e de construção de identidade dos falantes.
  • Escola Americana: Baseada especialmente nos estudos de Deborah Tannen e Erving Goffman, essa escola tem forte influência da pragmática e da sociolinguística. Seu objeto de estudo principal é como o significado é construído no uso da linguagem em contextos específicos.
  • Escola de Genebra: Inspirada por um dos fundadores da linguística, Ferdinand de Saussure, essa escola, de viés estruturalista, enxerga a linguagem como sistema de signos e na relação entre linguagem e pensamento.

Análise do discurso x Análise de conteúdo: qual a diferença?

Embora semelhantes, a análise do discurso e a análise de conteúdo são diferentes. As duas analisam textos orais e escritos, no entanto, a análise do discurso trabalha com o sentido do discurso, enquanto a análise de conteúdo foca no conteúdo do texto. 

Assim, a análise de conteúdo é bem mais objetiva que a análise do discurso, isso porque, nela os textos são classificados por categorias pré-estabelecidas. Melhor dizendo, pode ser uma pesquisa quantitativa ou qualitativa para estudar uma quantidade extensa de textos. 

Já a análise do discurso, como falamos no decorrer deste artigo, foca no uso da linguagem, buscando a compreensão do sentido do texto a partir de suas construções ideológicas. 

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