Uma boa nota na prova discursiva para concursos pode ser seu passe expresso para a conquista de um cargo público. Para isso, é essencial compreender os desafios dessa etapa e como superá-los, como explica o professor Dino dos Santos.
Mestre em Linguística pela UnB, ex-consultor da Câmara Legislativa do DF e com 25 anos de experiência na preparação de candidatos, Dino ressalta que modelos prontos e macetes não são suficientes para garantir o sucesso. Ele destaca a importância de uma leitura atenta do comando da prova, do planejamento textual e da articulação clara das ideias, com uso preciso de conectivos e períodos bem estruturados.
Além disso, Dino aponta que o mindset do candidato faz toda a diferença. Abandonar a ideia de escrita inspirada e adotar uma abordagem lógica e estratégica são passos essenciais. O professor também recomenda treinos supervisionados e revisões criteriosas para maximizar o desempenho e transformar o sonho do cargo público em realidade.
Confira abaixo a entrevista completa!

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TogglePrincipais desafios em provas discursivas em concursos públicos
Clube do Português: Quais são os principais desafios enfrentados pelos candidatos nas provas discursivas em concursos públicos?
Professor Dino: O primeiro desafio é o candidato entender que os modelos prontos, esquemas e frases feitas, amplamente difundidos em cursos na internet, não funcionam ou são insuficientes para garantir sucesso na prova discursiva. Macetes não trazem bons resultados na hora H.
O segundo desafio é o candidato entender que o processo de produção de uma discursiva que mereça a nota máxima, ou se aproxime desta, será sempre um exercício de escrita a partir de um exercício de leitura. Por outras palavras, é preciso ter uma estratégia para ler e compreender o comando da prova de forma objetiva e direta.
Por isso, a Teoria das Perguntas Argumentativas e Expositivas é tão importante nesta etapa, porque textos respondem perguntas diretas ou indiretamente formuladas pelo examinador, no comando, nos tópicos ou nos textos motivadores.
O terceiro desafio é entender que, para um texto se tornar claro, objetivo e conciso, é preciso cuidar da articulação dos períodos e dos parágrafos. Períodos com invertidas ou intercaladas longas costumam ser de difícil leitura, assim como períodos longos, com mais de três ou quatro linhas e cheios de queísmo ou gerundismo.
Outro ponto é entender que argumentar é trabalhar com os conectivos de coordenação e subordinação, que revelam, no papel, as relações lógicas da mente humana. A sintaxe é um sistema lógico que, na estrutura profunda, é semelhante em todas as línguas.
Embora as ideias de um candidato possam ser infinitas, para expressá-las, terá de seguir as normas da gramática, ou ninguém vai entendê-lo. A vantagem é que o sistema sintático está entronizado na mente de qualquer falante e, com estratégias, é possível os candidatos superarem as barreiras da prova discursiva e materializarem o sonho de serem servidor público.
Mindset dos aprovados
Clube do Português: Como o mindset do candidato pode impactar o desempenho em provas discursivas e como ajustá-lo para alcançar melhores resultados?
Professor Dino: Costumo dizer que o estudo de literatura e de gramática é muito bem trabalhado ao longo do ensino fundamental e médio, mas, por diversas razões, a produção textual corriqueira, com dissertações, artigos e cartas, não costuma ser bem trabalhada – com várias exceções dignas de nota.
Assim, o ato de escrever tende a se reduzir à inspiração, à tentativa e erro, como se não houvesse uma lógica no planejamento e na confecção de um texto dissertativo. Há mais de 27 anos, faço a mesma pergunta nos meus cursos: o que é argumentar?
A resposta é bastante padronizada: é defender um ponto de vista, sustentar a opinião e por aí vai.
Poucos sabem que são os conectivos lógicos de coordenação e subordinação que materializam a argumentação na fala e na escrita, por meio de aditividade, adversidade, causalidade, finalidade, entre outras relações.
Portanto, é preciso mudar o mindset dos candidatos, mostrando como as linhas de um texto são preenchidas por meio de períodos simples ou compostos por subordinação e coordenação. Ajuda muito desmontar bons textos, para o candidato entender o processo de construção frasal, a importância da frase declaratória como base do pensamento no papel e dos conectivos como fundamento da argumentação.
Conectivos certos para provas discursivas
Clube do Português: Você poderia explicar como a escolha adequada de conectivos e a organização sintática podem melhorar a clareza e a coesão do texto?
Professor Dino: O ser humano fala por declarações, ou seja, o núcleo do pensamento no papel será uma afirmação ou negação de sentido completo, com os termos essenciais da oração, sujeito, verbo e complemento.
Mas o ser humano não fala apenas por declarações, com se fosse uma metralhadora, porque as declarações precisam se sustentar na argumentação, articular-se em períodos, por meio dos conectivos de subordinação e coordenação. É preciso entender os movimentos do texto no papel, como a construção de períodos e parágrafos ocorre.
Vale muito, também, visitar os grandes mestres, Machado de Assis, por exemplo e tentar entender a articulação lógica dos períodos, para, à medida do possível, reaproveitá-las em novos contextos linguísticos.
Costumo dizer que um bom caderno de anotação de estruturas frasais é sempre de grande valia. Para escrever bem, precisamos aprender a colher na língua a palavra e a estrutura frasal adequadas a expressão de determinado pensamento. Isso porque nós não podemos inventar estruturas sintáticas novas, apenas usar as disponíveis na sintaxe, ou não seremos compreendidos.
Rascunho: fazer ou não fazer?
Clube do Português: Na hora da prova, o senhor recomenda fazer um rascunho da redação ou escrever a discursiva direto na folha de respostas definitiva?
Professor Dino: Quando me preparei para os concursos que fiz, aprendi a escrever sem rascunho. Nos idos dos anos 80 e 90, os computadores estavam chegando, mas tive um professor que me ensinou a imaginar uma tela virtual, escrever mentalmente cada período e depois transcrever para o papel.
É claro que isso requer um bom planejamento textual, baseado na Teoria das Perguntas, e um excelente Controle Fraseológico, com lapidação de estilo. De início, vai parecer mais lento e trabalhoso escrever sem rascunho, mas, com treino e paciência, vai economizar muito tempo que poderá ser utilizado para uma revisão mais criteriosa da prova tanto discursiva quanto objetiva.
Preparação para provas discursivas
Clube do Português: Qual a melhor maneira de treinar para as provas discursivas de concursos?
Professor Dino: Primeiro, é preciso ler atentamente o edital e saber qual será a modalidade de texto cobrado pela Banca e como esta formulou as provas discursivas de concursos anteriores, com os critérios de conteúdo e gramática. Resposta padrão contribui muito também.
Depois, o melhor é treinar com provas já aplicadas pela mesma Banca, ou com simulados bem elaborados. Por fim, é fundamental submeter as redações a um profissional qualificado para avaliá-las quanto à forma e ao conteúdo. É impressionante como se vendem cursos de redação, sem a possibilidade de o candidato adquirir módulos de correção, ou se corrige apenas a gramática.
Não se aprende a redigir somente por dicas, muito menos por modelos prontos esquemas, frases feitas e macetes. É preciso praticar, mas sob supervisão, porque o fato de você escrever uma redação por dia pode significar a consolidação de erros, tanto de interpretação do comando da prova quanto de construção fraseológica. Isso poderá levar a uma nota ruim ou mesmo à reprovação no concurso. Não basta apenas praticar.