7 questões de português que assustaram os concurseiros

Você está na sala de prova, tudo indo bem, até que ela aparece: a questão de português que faz você questionar não só os seus estudos, mas a própria lógica da língua. As alternativas confundem, as mãos suam, e você começa a duvidar até do que sabia com certeza.

Essa é a sensação de quem já deu de cara com uma das 7 questões de português de tirar o sono que vamos analisar neste artigo. Aqui, vamos mostrar a estratégia correta para resolver cada uma delas. Confira!

questões de português difíceis

1) Textos injuntivos

FGV – 2023 – Câmara dos Deputados – Consultor Legislativo – Área XX – Tarde

Todas as frases a seguir são exemplos de textos injuntivos.

Assinale a opção em que a injunção mostra seu modo de expressão identificado de forma incorreta. 

a) Não dê mais atenção ao que ele fala: emprego do modo imperativo. 
b) A receita dizia: “Acrescentar mais uma colher de açúcar!” / emprego do infinitivo dirigido a um grupo indeterminado de pessoas. 
c) José, agora você sai, não vai nadar mais! / utilização do discurso direto. 
d) Os paulistas aqui presentes: podem levantar a mão, por favor! / emprego de uma ordem atenuada na forma verbal. 
e) Que Deus esteja com todos vocês! / emprego do subjuntivo como expressão de um desejo.

Resposta: Letra C.

Comentário: Não há uso de discurso direto na frase. De acordo com Evanildo Bechara, “o discurso direto reproduz, ou supõe-se que reproduz, fiel e textualmente, as palavras de um interlocutor em diálogo. A fala do outro é reproduzida como período independente, precedida por um verbo declarativo, expletivo ou dicendi (dizer, responder, perguntar, retrucar, entre outros)”. 

Perceba que não há a presença dos elementos acima na frase da letra C. O que ocorre nessa sentença é o uso do imperativo, que é outra característica do texto injuntivo.

Nesse contexto, o professor Fernando Pestana explica que os principais elementos dessa tipologia textual são:

  • Normalmente apresenta frases curtas e objetivas, com verbos de comando, com tom imperativo; há também o uso do futuro do presente (10 mandamentos bíblicos e leis diversas).
  • Marcas de interlocução: vocativo, verbos e pronomes de 2ª pessoa ou 1ª pessoa do plural, perguntas reflexivas etc.

2) Regência ou voz passiva?

FGV – 2023 – Professor de Educação Básica (SEDUC TO)/Letras/Português e Redação

Observe a frase a seguir.

“Felicidade é alguém para amar, algo para fazer e algo para aspirar.”

Se modificarmos essa frase, que mostra um erro de regência, para a voz passiva, a forma adequada será: 

a) Felicidade é alguém para ser amado, algo para ser feito e algo para ser aspirado.
b) Felicidade é alguém a quem amar-se, algo para fazer-se e algo para aspirar-se. 
c) Felicidade é alguém para ser amado, algo para ser feito e algo para aspirar.
d) Felicidade é alguém para ser amado, algo para ser feito e algo para aspirar-se.
e) Felicidade é alguém para amar-se, algo para ser feito e algo para aspirar-se.

Resposta: Letra C

Comentário: Essa questão é perigosa, porque a frase possui um erro de regência. Afinal, o verbo “aspirar” pede a preposição “a”, e não “para”. Logo, a forma correta seria:

  •  Felicidade é alguém para amar, algo para fazer e algo a aspirar.

Porém, esse erro já é indicado no enunciado e a questão não cobra regência. Dessa forma, a banca utilizou esse fato apenas para gerar uma distração. Afinal, a questão trata de um tema distinto, que é a passagem da voz ativa para a voz passiva

Dito isso, para encontrar a resposta correta, você precisa saber que, em regra, somente verbos transitivos direto podem ir para a voz passiva. Dessa forma, o verbo “aspirar”, por ser transitivo direto e indireto, não admite a passagem para a voz passiva.

Como mostram Celso Cunha e Lindley Cintra, “quando uma oração contém um verbo construído com objeto direto, ela pode assumir a forma passiva”. Essa passagem da voz ativa para passiva ocorre da seguinte forma:

a) o objeto direto passa a ser sujeito da passiva;

b) o verbo passa à forma passiva analítica do mesmo tempo e modo;

c) o sujeito converte-se em agente da passiva.

Para compreender melhor as diferenças entre a voz ativa e a passiva, confira a tabela abaixo:

CaracterísticasVoz AtivaVoz Passiva
SujeitoO sujeito é o agente da ação.O objeto direto da ativa torna-se o sujeito da passiva.
FocoAção realizada pelo sujeito.Resultado ou objeto da ação, enfatizando menos o agente.
EstruturaSimples e direta, sem necessidade de transformações adicionais.Exige o uso de verbo auxiliar seguido do particípio do verbo principal.
Exemplo“O aluno escreveu a redação.”“A redação foi escrita pelo aluno.”

3) Perspectiva particular do enunciador

Instituto Consulplan – 2024 – Prefeitura de Divinópolis – MG – Professor de Educação Física

Dentre os trechos destacados a seguir, NÃO é possível identificar a expressão explícita de perspectiva particular do enunciador em: 

a) “Diante desse cenário, é crucial que a pressão da sociedade civil continue a crescer, engajando cada vez mais pessoas nesta causa.” (4º§)

b) “[…] reforça a importância de ações nesse sentido, que podem não apenas dissuadir os empregadores de recorrerem a essa mão de obra, mas também evitar reincidências.” (4º§)

c) “O ano de 2023 foi marcado por um número alarmante de denúncias de trabalho análogo à escravidão no Brasil, com um total de 3.422 registros em apenas 12 meses, […]” (1º§)

d)“[…] que divulga pessoas físicas e empresas que submetem trabalhadores a mão de obra forçada, jornadas exaustivas, condições degradantes ou restrição de locomoção, adicionou 248 empregadores em 2024, […]” (2º§)

Resposta: Letra D.

Comentário: Quando a questão fala sobre  identificar a expressão explícita de perspectiva particular do enunciador, ela está pedindo que você encontre os chamados modalizadores discursivos. São elementos linguísticos que indicam a atitude, a opinião ou posicionamento do enunciador em relação a um tema.

Nesse sentido, os modalizadores mais comuns são:

  • Advérbios (certamente, aparentemente, supostamente, etc.)
  • Adjetivos (preocupante, difícil, provável, etc.)
  • Verbos e locuções verbais (acho que, percebo que, pode ser que, deve ser, etc.)
  • Conjunções (se, embora, caso, etc.)
  • Substantivos (opinião, juízo, hipótese, etc.)

Dito isso, vamos analisar cada uma das alternativas para encontrar os modalizadores utilizados:

a) “Diante desse cenário, é crucial que a pressão da sociedade civil continue a crescer, engajando cada vez mais pessoas nesta causa.” (4º§)

b) “[…] reforça a importância de ações nesse sentido, que podem não apenas dissuadir os empregadores de recorrerem a essa mão de obra, mas também evitar reincidências.” (4º§)

c) “O ano de 2023 foi marcado por um número alarmante de denúncias de trabalho análogo à escravidão no Brasil, com um total de 3.422 registros em apenas 12 meses, […]” (1º§)

d)“[…] que divulga pessoas físicas e empresas que submetem trabalhadores a mão de obra forçada, jornadas exaustivas, condições degradantes ou restrição de locomoção, adicionou 248 empregadores em 2024, […]” (2º§) (não há uso de modalizadores)

4) Imprecação e esconjuro

SCGás – 2014 – SCGás – Analista de Sistemas da Informação

Talvez só Steven Pinker possa concorrer com Saussure em sua quase irritação com certa idiotice dos “sábios”. Criticando duramente os colunistas de plantão que bradam contra a decadência da língua (também os há nos Estados Unidos!), Pinker profere a seguinte imprecação: “Eu digo a eles: Maven, shmaven! Kibbitzers e nudiks seria mais apropriado”. A sequência é assim traduzida por Claudia Berliner: “Que craques, que nada! Metidos a pentelhos seria mais apropriado” (O instinto da linguagem, p. 481).

Assinale a alternativa que contenha o sentido correto, de acordo com seu emprego no texto, para a palavra “imprecação”, destacada no techo acima:

a) Claudicância.
b) Excrescência.
c) Recado.
d) Esconjuro.

Resposta: Letra D

Comentário: Essa é uma questão cruel e que não avalia de fato a capacidade do candidato. Afinal, ela trata de palavras de raríssimo uso no dia a dia das pessoas. De toda forma, vamos conhecer o significado de cada termo. Segundo o dicionário Priberam, temos:

  • Imprecação: praga, maldição ou súplica veemente.
  • Claudicância: falta de firmeza, falta de cumprimento dos deveres.
  • Excrescência: demasia, excesso, superfluidade; coisa que desequilibra a harmonia de um todo.
  • Esconjuro: juramento com imprecação, exorcismo

5) Conteúdo concreto acumulativo

FGV – 2024 – Prefeitura de Abreu e Lima – PE – Assistente Social

Observe o seguinte texto descritivo:

“O pessegueiro estava alto, mas suas folhas mostravam uma coloração amarelada, que parecia problemática; os galhos estavam cobertos de uma espécie de farinha branca e os poucos frutos ainda estavam pequenos”.

Sobre esse pequeno texto, assinale a afirmativa correta. 

a) Texto de conteúdo concreto acumulativo, o que dificulta a apreensão de uma unidade global.
b) Texto de conteúdo abstrato, com justaposição de ideias para a construção da ideia global do objeto descrito. 
c) Texto cujo observador segue uma estratégia de movimento de longe para perto.
d) Texto em que predomina a informação de fatos, situações e acontecimentos.
e) Texto cujos segmentos mostram relação lógica de causa e efeito, mostrando sequência cronológica.

Resposta: Letra A.

Comentário: Essa questão parece mais complexa do que realmente é por conta da linguagem utilizada pela banca. 

Contudo, o que a alternativa A diz é que o texto apresenta um conteúdo concreto acumulativo, ou seja, vai descrevendo as partes do objeto, como frutos e características (conteúdo concreto), de forma sequencial (conteúdo acumulativo) sem se aprofundar em cada uma delas. 

Essa abordagem faz com que o leitor tenha dificuldade em formar uma visão completa do todo, que, neste caso, seria a árvore como um elemento integrado (falta de apreensão global).

Agora vamos analisar as demais alternativas:

b) Texto de conteúdo abstrato, com justaposição de ideias para a construção da ideia global do objeto descrito. (O conteúdo do texto é predominantemente concreto, pois aborda elementos observáveis da árvore.)

c) Texto cujo observador segue uma estratégia de movimento de longe para perto. (Não há essa mudança de perspectiva do observador. O texto transcorre todo sob o mesmo ponto de vista.)

d) Texto em que predomina a informação de fatos, situações e acontecimentos. (O texto é predominantemente descritivo, listando apenas características do pessegueiro.)

e) Texto cujos segmentos mostram relação lógica de causa e efeito, mostrando sequência cronológica. (Não há sequência cronológica no texto, muito menos relação de causa e efeito. Há somente a descrição de característica da árvore.)

6) Mecanismo de coerência

MARANATHA Assessoria – 2024 – Prefeitura de Califórnia – PR – Enfermeiro 40H

Constitui um mecanismo para a coerência textual:

a) conjugação verbal. 
b) contradição.
c) relevância. 
d) conjunção.

Resposta: Letra C.

Comentário: Tema bastante aprofundado para uma prova para enfermeiro, hein!? Para responder essa questão, é preciso recorrer ao livro “Texto e Coerência”, de Ingedore Koch e Luiz Carlos Travaglia. 

Na obra, os linguistas dizem que o estabelecimento da coerência depende dos seguintes elementos: conhecimento linguístico, conhecimento de mundo, conhecimento partilhado, inferências, fatores pragmáticos, situacionalidade, intencionalidade e aceitabilidade, informatividade, relevância, focalização e a intertextualidade. 

Questões de português difíceis: elementos da coerência textual.

7) Interpretação de poema

AGIRH – 2024 – Prefeitura de Roseira – SP – Engenheiro Civil

Leia atentamente o poema Lembrança rural, de Cecília Meireles, para responder à questão.

Lembrança rural 

Chão verde e mole. Cheiros de selva. Babas de lodo.
A encosta barrenta aceita o frio, toda nua.
Carros de bois, falas ao vento, braços, foices.
Os passarinhos bebem do céu pingos de chuva.

Casebres caindo, na erma tarde. Nem existem
na história do mundo. Sentam-se à porta as mães descalças.
É tão profundo, o campo, que ninguém chega a ver que é triste.
A roupa da noite esconde tudo, quando passa…

Flores molhadas. Última abelha. Nuvens gordas.
Vestidos vermelhos, muito longe, dançam nas cercas.
Cigarra escondida, ensaiando na sombra rumores de bronze.
Debaixo da ponte, a água suspira, presa…

Vontade de ficar neste sossego toda a vida:
bom para ver de frente os olhos turvos das palavras,
para andar à toa, falando sozinha,
enquanto as formigas caminham nas árvores…

Leia atentamente as afirmações a seguir:

I – É possível afirmar que o poema é descritivo.

II – O verso “Flores molhadas. Última abelha. Nuvens gordas.” contém três exemplos de orações nominais.

III – O eu lírico descreve a paisagem e o cotidiano de uma cidade rural.

É (São) correta(s) a(s) afirmação(ões): 

a) Todas.
b) I e III.
c) Apenas II.
d) Apenas I.

Resposta: Letra B.

Comentário: Questões que envolvem poemas são sempre perigosas, porque há uso de linguagem conotativa ou figurada, o que acrescenta certo grau de subjetividade na interpretação do texto. Nesse sentido, vamos avaliar cada uma das alternativas:

I – É possível afirmar que o poema é descritivo.

O poema é descritivo, porque pinta imagens da paisagem rural com riqueza de detalhes sensoriais (visuais, olfativos e auditivos), como em “Chão verde e mole. Cheiros de selva. Babas de lodo.” e “Flores molhadas. Última abelha. Nuvens gordas.”

II – O verso “Flores molhadas. Última abelha. Nuvens gordas.” contém três exemplos de orações nominais.

Os trechos acima são frases nominais, e não orações nominais. Afinal, orações nominais são aquelas que possuem verbo de ligação e predicativo do sujeito.

Diferenças entre frase, oração e período.

III – O eu lírico descreve a paisagem e o cotidiano de uma cidade rural.

O poema descreve o ambiente e a vida cotidiana no campo, com referências a casebres, mães descalças, carros de bois e atividades típicas do espaço rural. Embora não seja um retrato de uma cidade no sentido estrito, o termo “cidade rural” pode ser entendido aqui como uma referência ao cotidiano de uma comunidade ou povoado em ambiente rural.

Referências

  • Moderna Gramática Portuguesa, Evanildo Bechara;
  • A Gramática para Concursos Públicos, Fernando Pestana;
  • Texto e Coerência, Ingedore Koch e Luiz Carlos Travaglia.

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